DOMICILIAR SOBRE A
SAÚDE INFANTIL NO BRASIL
Maurício Reis
Anna Crespo
TEXTO PARA DISCUSSÃO No 1397
O IMPACTO DA RENDA
DOMICILIAR SOBRE A
SAÚDE INFANTIL NO BRASIL
Maurício Reis*
Anna Crespo**
Produzido no programa de trabalho de 2009
Rio de Janeiro, fevereiro de 2009
* Técnico de Planejamento e Pesquisa da Diretoria de Estudos Sociais – Disoc/Ipea.
** Aluna de Doutorado do Departamento de Economia da Universidade de Princeton.
Governo Federal
Ministro de Estado Extraordinário
de Assuntos Estratégicos – Roberto Mangabeira Unger
Secretaria de Assuntos Estratégicos
Fundação pública vinculada à Secretaria de Assuntos
Estratégicos, o Ipea fornece suporte técnico e
institucional às ações governamentais – possibilitando
a formulação de inúmeras políticas públicas e
programas de desenvolvimento brasileiro – e
disponibiliza, para a sociedade, pesquisas e estudos
realizados por seus técnicos.
Presidente
Marcio Pochmann
Diretor de Administração e Finanças
Fernando Ferreira
Diretor de Estudos Macroeconômicos
João Sicsú
Diretor de Estudos Sociais
Jorge Abrahão de Castro
Diretora de Estudos Regionais e Urbanos
Liana Maria da Frota Carleial
Diretor de Estudos Setoriais
Márcio Wohlers de Almeida
Diretor de Cooperação e Desenvolvimento
Mário Lisboa Theodoro
Chefe de Gabinete
Persio Marco Antonio Davison
Assessor-Chefe da Assessoria de Imprensa
Estanislau Maria
Assessor-Chefe da Comunicação Institucional
Daniel Castro
URL: http:/www.ipea.gov.br
Ouvidoria: http:/www.ipea.gov.br/ouvidoria
ISSN 1415-4765
JEL: I10, I12, I31
TEXTO PARA DISCUSSÃO
Publicação cujo objetivo é divulgar resultados de
estudos direta ou indiretamente desenvolvidos pelo
Ipea, os quais, por sua relevância, levam informações
para profissionais especializados e estabelecem um
espaço para sugestões.
As opiniões emitidas nesta publicação são de
exclusiva e de inteira responsabilidade do(s)
autor(es), não exprimindo, necessariamente, o
ponto de vista do Instituto de Pesquisa Econômica
Aplicada ou da Secretaria de Assuntos Estratégicos.
É permitida a reprodução deste texto e dos dados nele
contidos, desde que citada a fonte. Reproduções para
fins comerciais são proibidas.
SUMÁRIO
SINOPSE
ABSTRACT
1 INTRODUÇÃO 7
2 DADOS 8
3 ANÁLISE DESCRITIVA 10
4 RESULTADOS 13
5 CONCLUSÃO 19
REFERÊNCIAS 20
SINOPSE
Diversos estudos indicam que a renda domiciliar parece um importante determinante
da saúde infantil. Este trabalho tem como objetivo documentar a relação entre renda e
saúde das crianças no Brasil, usando três diferentes bases de dados e várias medidas de
saúde. Na análise empírica, são utilizadas informações da Pesquisa de Orçamentos
Familiares (POF) de 2002/2003, do suplemento de saúde da Pesquisa Nacional por
Amostra de Domicílios (Pnad) de 2003 e da Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde
(PNDS) de 2006. Os resultados mostram que crianças mais pobres tendem a ter
condições de saúde significativamente piores do que crianças mais ricas, mesmo
controlando para uma série de características individuais e dos seus pais. Além disso,
são apresentadas evidências de que crianças mais ricas normalmente se recuperam
melhor de choques negativos de saúde. Como crianças menos saudáveis podem ter sua
capacidade produtiva reduzida no futuro, os resultados apresentados neste artigo
sugerem que as condições de saúde infantil no Brasil podem se constituir em um
importante mecanismo de transmissão intergeracional de desigualdade nas condições
socioeconômicas.
ABSTRACT
There are several studies showing that household income seems to be an important
determinant of children’s health. The objective of this paper is to document the
relationship between income and children’s health in Brazil using three data sources
and many health indicators. The empirical analysis is conducted with information
from the 2002/2003 POF (Consumer Expenditure Survey), the 2003 Pnad (Brazilian
National Household Survey) and the 2006 PNDS (Demographic and Health
Survey). According to the results, children who live in poorer households are likely to
have worse health status than richer children even controlling for many individual
and parents’ characteristics. In addition, there is evidence that richer children recover
better from negative health shocks than poorer ones. Because children in poor health
could have their productivity capacity reduced in the future, the evidence presented
in this paper indicates that children’s health status in Brazil could be an important
mechanism of intergenerational transmission of socioeconomic inequality.
ipea texto para discussão | 1397 | fev. 2009 7
1 INTRODUÇÃO
Diversos artigos na literatura econômica mostram que baixos níveis de renda estão
associados a piores condições de saúde (PRESTON, 1975; PRITCHETT;
SUMMERS, 1996; FOGEL, 1994, 1997; SMITH, 1999; CASE; DEATON, 2005).
Pessoas mais pobres normalmente vivem em piores ambientes e têm pior nutrição,
tornando-se, portanto, mais sujeitas a doenças, assim como devem ter menos acesso a
serviços de saúde de melhor qualidade. Por outro lado, a própria precariedade da
saúde pode levar a rendimentos mais baixos, já que a produtividade de um indivíduo
deve depender positivamente de suas condições de saúde.
Estudos voltados para a saúde infantil também apontam para uma relação
positiva entre renda e saúde desde a primeira infância. Supondo que as crianças não
contribuam para a renda domiciliar, é possível eliminar a causalidade da saúde sobre a
renda, desde que o comportamento dos pais no mercado de trabalho não dependa da
saúde dos filhos.1 Portanto, a correlação observada entre essas duas variáveis pode ser
resultante do efeito da renda na saúde, mas também do impacto de outros fatores –
correlacionados com a renda domiciliar – que devem influenciar a saúde das crianças.
Case, Lubotsky e Paxson (2002) encontram evidências de que a renda domiciliar
influencia positivamente as condições de saúde das crianças com idade entre 0 e 17
anos nos Estados Unidos. Em particular, este estudo também apresenta evidências de
que parte da correlação entre saúde e renda é resultante da educação dos pais, que
afeta positivamente ambas as variáveis. Resultados semelhantes são observados para o
Canadá (CURRIE; STABILE, 2003) e para a Inglaterra (CURRIE; MORETTI,
2007; CASE; LEE; PAXSON, 2007). Duflo (2000), por sua vez, mostra que
programas de transferência de renda na África do Sul melhoraram o status nutricional
(medido pela altura) das crianças de 0 a 5 anos, no caso das meninas e quando os
benefícios foram recebidos por uma mulher. Para o Brasil, Hoffmann (1998) mostra
uma associação positiva entre renda e altura das crianças, e Crespo e Reis (2008)
apresentam evidências de que maiores níveis de renda estão associados à melhor saúde
reportada, apesar do recente avanço do sistema público de saúde brasileiro.
Analisar a relação entre renda e saúde infantil é uma questão particularmente
importante no caso do Brasil. Conforme documentado em diversos estudos, uma
elevada parcela da população brasileira vive abaixo da linha de pobreza. Evidências
apresentadas por Barros et al. (2007a), por exemplo, mostram que 34,1% da
população vivia na pobreza em 2005; enquanto 13,2% estava abaixo da linha de
extrema pobreza.2 Além disso, a pobreza no Brasil incide principalmente sobre as
crianças. Barros (2008) mostra que a proporção de crianças vivendo em situação de
extrema pobreza chega a quase 20%, bem superior à média do país, portanto. Por
outro lado, a renda domiciliar média dos 10% mais ricos da população é quase 20
vezes maior do que a média dos 40% mais pobres (BARROS et al., 2007a). Ou seja,
crianças nos estratos mais altos da distribuição de renda devem ter acesso a serviços de
1. Case, Lubotsky e Paxson (2002) para os Estados Unidos e Crespo e Reis (2008) para o Brasil não encontram
evidências de que a saúde dos filhos influencie a oferta de trabalho dos pais.
2. Para este cálculo, são utilizados dados da Pnad e linhas de pobreza regionalizadas, considerando R$ 162,6 a média
nacional para a pobreza e R$ 81,3 a média para a extrema pobreza.
8 texto para discussão | 1397 | fev. 2009 ipea
saúde de melhor qualidade, boa nutrição e normalmente vivem em melhores
ambientes, fatores que devem contribuir para melhorar as condições de saúde.
O objetivo deste artigo é investigar a relação entre renda domiciliar e saúde das
crianças no Brasil. Dada a dificuldade de mensurar a saúde através de uma única
variável, diversos indicadores são usados na análise empírica a partir de dados de três
diferentes pesquisas: a Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF) de 2002/2003, o
suplemento de saúde da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) de
2003 e a Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde (PNDS) de 2006. De acordo
com as evidências obtidas, crianças vivendo em domicílios mais pobres apresentam,
em média, piores condições de saúde do que crianças em domicílios com renda mais
elevada. Esses resultados se mantêm mesmo com a inclusão de diversos controles para
características dos pais, como educação e idade, e de variáveis que procuram captar o
estado de saúde da criança ao nascer, assim como o comportamento e as condições de
saúde dos pais. São apresentadas também evidências de que crianças mais ricas
tendem a se recuperar melhor de piores condições de saúde ao nascer, representadas
por baixo peso no nascimento.
De acordo com os resultados estimados, portanto, baixos níveis de renda
domiciliar, além das privações que devem impor às pessoas vivendo nessas condições,
também podem implicar piores condições de saúde para os integrantes da família.
Esse resultado pode ter consequências particularmente importantes no caso infantil.
Crianças menos saudáveis tendem a ter pior desempenho escolar e a se tornarem
adultos menos saudáveis, conforme mostram outros trabalhos na literatura.3 Estes
dois últimos fatores, por sua vez, constituem determinantes importantes do
desempenho no mercado de trabalho na vida adulta. Para o Brasil, Machado (2008)
apresenta evidências de que crianças em condições precárias de saúde tendem a entrar
mais tarde na escola e assim acabam mais atrasadas do que crianças mais saudáveis.
Portanto, crianças que crescem em domicílios pobres não apenas podem ter piores
condições de saúde na infância, mas também serão provavelmente menos capazes de
gerar renda quando adultas, permanecendo na pobreza no longo prazo. Dessa forma,
a relação entre renda e saúde infantil pode ser um importante transmissor de
desigualdade socioeconômica entre gerações.
Este artigo é composto por quatro seções, além desta introdução. Na seção 2, são
descritos os dados utilizados. Na seção 3, é feita uma análise descritiva desses dados. A
seção 4 apresenta a abordagem empírica usada para estimar o impacto da renda
domiciliar sobre as condições de saúde das crianças, assim como os resultados
encontrados. As principais conclusões da nossa análise estão na seção 5.
2 DADOS
Os dados utilizados neste trabalho provêm de três fontes, a POF de 2002/2003, o
suplemento sobre saúde da Pnad de 2003 e a PNDS de 2006, todas representativas
da população brasileira como um todo. As duas primeiras foram conduzidas pelo
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e a terceira faz parte do projeto
3. Ver, por exemplo, Case, Fertig e Paxson (2005); Case e Paxson (2006); e Currie (2008).
ipea texto para discussão | 1397 | fev. 2009 9
Demographic and Health Surveys (MEASURE DHS),4 implementado em vários
países com o apoio da United States Agency-International Development (USAID) .
Entre julho de 2002 e junho de 2003 foram entrevistadas pela POF mais de 180
mil pessoas em cerca de 48 mil domicílios. Dessa fonte de dados, são utilizadas
informações de 10.923 crianças, filhos ou filhas da pessoa de referência, com idade entre
6 e 60 meses. Além das informações sobre consumo e renda, a POF também inclui o
peso e a altura das pessoas entrevistadas, que, de acordo com a Organização Mundial de
Saúde (OMS) (WHO, 1986),5 constituem as melhores medidas para se avaliar o status
nutricional de crianças com menos de 60 meses. Dessa forma, usando os dados da POF,
são construídas medidas padronizadas – z-scores – para o peso e a altura tendo como
referência uma base de crianças norte-americanas fornecida pelo National Center for
Health Statistics (NCHS). O z-score da altura de uma determinada criança, por exemplo,
é calculado subtraindo-se o valor da sua altura da mediana do grupo de referência com o
mesmo sexo e a mesma idade em meses e dividindo essa diferença pelo erro-padrão do
grupo de referência com o mesmo sexo e a mesma idade. O z-score do peso é calculado de
forma análoga. A principal vantagem de se trabalhar com o z-score, em vez de usar
diretamente as medidas antropométricas das crianças, é que o z-score viabiliza a
comparação entre diferentes idades e sexos; ou seja, trata-se de uma medida cuja unidade
independe da idade e do sexo da criança considerada.
Cerca de 400 mil indivíduos em mais de 100 mil domicílios foram entrevistados
na Pnad de 2003. Pelo questionário do suplemento sobre saúde é possível obter
informações como a incidência de dias doente de cama, dias de atividades restritas e
de vômito ou diarreia, nas duas semanas anteriores à entrevista. Além disso, os pais ou
responsáveis classificam o estado de saúde da criança de acordo com uma escala de 1 a
5 em que: 1 indica saúde muito boa; 2, saúde boa; e 3, saúde regular, enquanto 4 e 5
indicam saúde ruim e muito ruim, respectivamente.6 Dos dados da Pnad, são
utilizadas informações sobre crianças com idade entre 6 meses e 9 anos. A restrição a
crianças de 9 anos ou menos se deve ao problema de dupla causalidade entre saúde e
renda. Nessa faixa de idade, porém, a proporção de crianças participando do mercado
de trabalho é muito baixa.7 A amostra também se limita a crianças nas condições de
filhos ou filhas da pessoa de referência. No total, são usados dados de mais de 58 mil
crianças da Pnad.
A terceira fonte de dados é a PNDS de 2006. Entre novembro de 2006 e abril de
2007 foram entrevistados mais de 14 mil domicílios nessa pesquisa. Nos domicílios
com mulheres de 15 a 49 anos, também foram coletadas várias informações sobre o
estado de saúde delas e dos seus filhos, principalmente para os nascidos depois de
janeiro de 2001. Na PNDS, as informações foram obtidas tanto através de entrevistas
4. Disponível em:
5. Duflo (2000) argumenta que o déficit em desenvolvimento infantil em países subdesenvolvidos se deve a dois fatores
principais: alimentação inadequada e infecções. Somente na adolescência é que fatores genéticos desempenham um
papel importante.
6. Embora esta forma de avaliar a saúde esteja sujeita a inúmeras críticas pelo seu grau de subjetividade, existem
diversos estudos mostrando que ela tende a ser consistente com outras formas de avaliação mais objetivas (WARE;
DAVIES-AVERY; DONALD, 1978; IDLER; BENYAMINI, 1997).
7. Menos de 1% das crianças com idade entre 5 e 9 anos declararam participar do mercado de trabalho em 2003.
10 texto para discussão | 1397 | fev. 2009 ipea
quanto de mensurações antropométricas, como na POF, e de análises laboratoriais de
amostras de sangue para dosagens de hemoglobina e vitamina A.
A partir dos dados da PNDS são usadas oito medidas de saúde: o z-score do peso,
o z-score da altura, os níveis de hemoglobina e de vitamina A, variáveis indicando se a
criança teve tosse, febre e diarreia nas duas semanas anteriores e diarreia nos três
meses anteriores à pesquisa. Na mostra da PNDS são incluídas crianças nascidas a
partir de janeiro de 2001, para as quais todas as informações sobre medidas de saúde
estão disponíveis, resultando em mais de 6 mil observações. Para as análises dos zscores
do peso e da altura, a amostra é restrita a crianças com idade entre 6 e 60 meses.
3 ANÁLISE DESCRITIVA
Na tabela 1, são apresentadas estatísticas descritivas sobre as crianças nas amostras da
POF, da Pnad e da PNDS. É importante ressaltar, no entanto, que vários fatores
podem influenciar as comparações entre as pesquisas. Na amostra da POF, são
incluídas apenas crianças com menos de cinco anos, enquanto na Pnad e na PNDS
crianças mais velhas fazem parte da amostra. Além disso, as pesquisas foram realizadas
em diferentes períodos. Outra diferença é que na PNDS todas as mães
necessariamente estão presentes, o que não acontece nas duas outras pesquisas.
TABELA 1
Estatísticas descritivas
POF
(1)
Pnad
(2)
PNDS
(3)
Idade média (em meses) 33,77 59,44 36,58
Renda domiciliar per capita (R$) 428,88 264,85 236,47
Mulher (%) 50,26 49,09 47,55
Cor ou raça (%)
Branco 51,51 49,74
Negro 5,3 4,45
Asiático 0,48 0,21
Pardo 42,38 45,44
Indígena 0,32 0,16
Mãe com 8 anos ou mais de educação (%) 37,43 41,55 49,43
Pai com 8 anos ou mais de educação (%) 30,68 32,99 33,91
Idade média da mãe 28,14 30,90 27,68
Idade média do pai 28,17 30,10 28,26
z-score do peso –0,11 –0,102
z-score da altura –0,42 –0,114
Saúde reportada (média) 1,77
Atividade restrita (%) 7,54
Doente de cama (%) 4,28
Vômito ou diarreia (%) 1,40
(continua)
ipea texto para discussão | 1397 | fev. 2009 11
(continuação)
POF
(1)
Pnad
(2)
PNDS
(3)
Saúde reportada (%)
Muito boa 33,47
Boa 57,3
Regular 8,46
Ruim 0,66
Muito ruim 0,11
Anemia (%) 20,17
Baixo nível de vitamina A (%) 62,00
Febre no período de 2 semanas (%) 23,43
Tosse no período de 2 semanas (%) 37,57
Diarreia no período de 3 meses (%) 23,58
Diarreia no período de 2 semanas (%) 9,99
Observações 10,923 58,341 5.776
Fontes: POF de 2002/2003, Pnad de 2003 e PNDS de 2006. Elaboração do autor.
Na POF são incluídas crianças com menos de 5 anos, enquanto na Pnad e na PNDS as amostras incluem crianças com menos de 10 anos. A
anemia foi caracterizada pela concentração de hemoglobina abaixo de 11g/Dl. Foram consideradas com baixo nível de vitamina A as crianças com
menos de 1,05 μmol/L no exame de retinol.
A média da renda domiciliar per capita na Pnad (R$ 265) é um pouco maior do que
a obtida com os dados da PNDS (R$ 237). Com a POF, porém, a média da renda
domiciliar per capita é bem mais alta (R$ 429) do que nas duas outras pesquisas.8 Barros,
Foguel e Ulyssea (2007b) mostram que a renda domiciliar na POF é cerca de 25% maior
do que na Pnad, o que ainda é bem menor do que a diferença reportada na tabela 1.
Entre os 10% mais pobres, porém, a diferença chega a quase 50%. Domicílios com
crianças normalmente possuem renda mais baixa do que a média, o que também pode
ajudar a explicar parte da disparidade entre os valores da POF e das demais pesquisas.
A proporção de meninas é semelhante entre as pesquisas, assim como a
distribuição por cor ou raça na POF e na Pnad.9 As proporções de mães e pais com
pelo menos oito anos completos de estudo são maiores na PNDS e depois na Pnad,
com diferenças maiores para as mães. Já as médias de idade de pais e mães são
parecidas nas três pesquisas.
Os valores do z-score da altura, que avalia mais apropriadamente as condições
nutricionais de longo prazo, assim como do z-score do peso, são negativos na POF e na
PNDS, indicando uma situação pior do que a mediana do grupo de referência,
composto por crianças norte-americanas. Os dados da Pnad também mostram que
33,5% das crianças tiveram a saúde considerada muito boa e para 57,3% a saúde foi
reportada como boa. Ainda de acordo com a Pnad, 4,3% das crianças ficaram doentes
de cama nas duas semanas que antecederam a pesquisa. Durante esse mesmo período,
7,5% apresentaram restrições nas atividades diárias e 1,4% tiveram vômito ou diarreia.
8. Todos os valores são representados em reais de maio de 2007 usando o Índice Nacional de Preços ao Consumidor
(INPC) como deflator.
9. A PNDS não oferece informações sobre cor ou raça das crianças.
12 texto para discussão | 1397 | fev. 2009 ipea
Os dados da PNDS apresentados na tabela 1 mostram que cerca de 20% das
crianças apresentam anemia, definida por uma concentração de hemoglobina menor
do que 11 g/dl (WHO, 2001). Mais de 60% das crianças possuem nível inadequado
de vitamina A, que se caracteriza por valores inferiores a 1,05 μmol/L no exame de
retinol (RAMALHO; FLORES; SAUNDERS, 2002). Vinte e três por cento das
crianças na amostra da PNDS tiveram febre reportada, enquanto 38% tiveram tosse
nas duas semanas que antecederam a pesquisa. A tabela 1 mostra também que 24%
das crianças tiveram vômito no período de três meses antes da entrevista e 10% no
período de duas semanas. Este último valor é muito superior ao observado na Pnad
para o mesmo período de tempo. É possível que essa diferença se deva ao fato de
serem considerados na Pnad apenas casos de vômito ou diarreia que implicaram pelo
menos um dia de restrições nas atividades diárias da criança, enquanto na PNDS
todos os episódios de vômito foram considerados.
A relação entre renda domiciliar e saúde é descrita nesta seção através de uma análise
não-paramétrica. O gráfico 1 mostra regressões não-paramétricas das medidas de saúde
descritas anteriormente como função do logaritmo da renda domiciliar per capita.10
Resultados para o z-score do peso e o z-score da altura usando dados da POF são
mostrados no gráfico 1(a), enquanto o gráfico 1(b) apresenta os resultados usando a
PNDS. A relação entre a média da variável para saúde reportada na Pnad e a renda
domiciliar é mostrada no gráfico 1(c). As demais medidas de saúde da Pnad são
reportadas no gráfico 1(d). Os resultados para os níveis de hemoglobina e de vitamina A
são mostrados nos gráfico 1(e) e 1(f), respectivamente. Finalmente, o gráfico 1(g)
apresenta a relação entre renda domiciliar, de um lado, e as incidências de febre e de
tosse, de outro, enquanto no gráfico 1(h) são mostrados os resultados para a incidência de
vômito.
De acordo com os gráficos (1a) e (1b), rendas domiciliares mais elevadas estão
associadas a valores mais altos do z-score do peso e do z-score da altura, tanto com
dados da POF quanto da PNDS. O gráfico (1c) mostra que crianças em domicílios
mais ricos têm, em média, melhor saúde reportada, e pelo gráfico (1d) não se pode
notar uma relação clara entre renda domiciliar per capita e as incidências de dias
doente de cama, dias de atividade restrita e de vômito ou diarreia. O gráfico (1e)
indica que crianças em domicílios mais ricos apresentam normalmente níveis mais
elevados de hemoglobina. Já pelo gráfico (1f), a relação entre concentração de
vitamina A e renda é inicialmente positiva, depois fica constante e volta a ser positiva
para níveis mais elevados de renda. Nota-se no gráfico (1g) uma tendência negativa
entre a renda domiciliar e a incidência de febre e tosse. Finalmente, os resultados do
gráfico (1h) mostram que crianças mais ricas apresentam menor incidência de
diarreia, pelos dados da PNDS.
10. Essa análise é baseada no método de regressões locais (LOWESS).
ipea texto para discussão | 1397 | fev. 2009 13
GRÁFICO 1
Relação entre renda domiciliar e saúde – análise não-paramétrica
(1a) z-score do peso e da altura (POF)
-1,6
-1,2
-0,8
-0,4
0,0
0,4
0,8
3,00 3,50 4,00 4,50 5,00 5,50 6,00 6,50 7,00 7,50
log da renda domiciliar per capita
z-score do peso
(1b) z-score do peso e da altura (PNDS)
-0,8
-0,4
0,0
0,4
0,8
2,50 3,50 4,50 5,50 6,50 7,50
log da renda domiciliar per capita
z-score do peso
z-score da altura
(1c) Saúde reportada (Pnad)
1,4
1,6
1,8
2,0
3,00 3,50 4,00 4,50 5,00 5,50 6,00 6,50 7,00
log da renda domiciliar per capita
(1d) Doente de cama, atividades restritas e vômito ou
diarreia (PNAD)
0,00
0,02
0,04
0,06
0,08
0,10
3,00 3,50 4,00 4,50 5,00 5,50 6,00 6,50 7,00
log da renda domiciliar per capita
Doente de cama
Atividades restritas
Vômito ou diarreia
(1e) Concentração de hemoglobina (PNDS)
12,0
12,1
12,2
12,3
12,4
12,5
2,50 3,50 4,50 5,50 6,50 7,50
log da renda domiciliar per capita
(1f) Concentração de retinol (PNDS)
1,10
1,12
1,14
1,16
1,18
2,50 3,50 4,50 5,50 6,50 7,50
log da renda domiciliar per capita
(1g) Febre e tosse (PNDS)
0,20
0,25
0,30
0,35
0,40
0,45
0,50
2,50 3,50 4,50 5,50 6,50 7,50
log da renda domiciliar per capita
Febre
Tosse
(1h) Diarreia (PNDS)
0,00
0,05
0,10
0,15
0,20
0,25
0,30
0,35
2,50 3,50 4,50 5,50 6,50 7,50
log da renda domiciliar per capita
No período de 3 meses
No período de 2 semanas
Fontes: POF de 2002/2003, Pnad de 2003 e PNDS de 2006. Elaboração do autor.
4 RESULTADOS
4.1 ABORDAGEM EMPÍRICA
Vários fatores, além da renda domiciliar, devem influenciar a saúde das crianças. Por
exemplo, as características individuais dos seus pais e do domicílio em que vivem.
Vários desses fatores também devem estar correlacionados com a renda domiciliar.
Considerando-se essas outras variáveis, podemos representar a saúde das crianças
através da seguinte equação:
Si = f (Yi, Xi; εi)
14 texto para discussão | 1397 | fev. 2009 ipea
onde Si é a saúde da criança i, representada por uma das medidas definidas na seção
anterior, Yi é o logaritmo da renda domiciliar per capita dessa criança, Xi representa as
variáveis de controle e εi é o erro da regressão. Fazem parte das variáveis de controle
características das crianças: idade, sexo, dummies para a região de residência, uma
dummy indicando residência em área urbana e dummies para raça (considerando-se
cinco grupos: brancos, negros, pardos, asiáticos e indígenas). Essas variáveis são
incluídas em todas as regressões, com exceção de raça para a PNDS, já que a pesquisa
não possui essa informação. Também são estimadas regressões que incluem o número
de pessoas no domicílio, o número de crianças com menos de 5 anos, com idade
entre 5 e 9 anos e com idade entre 10 e 14 anos. Entre as características das mães e
dos pais, são incluídas: educação, idade e uma dummy para presença dos dois no
domicílio. Adicionalmente, são estimadas regressões que incluem variáveis que
procuram captar o comportamento dos pais, suas condições de saúde e uma medida
para a saúde das crianças ao nascer.
As regressões usando o z-score da altura e o z-score do peso são estimadas pelo
método de mínimos quadrados ordinários (MQO). Para a incidência de dias de
cama, atividades restritas, vômito ou diarreia – com a Pnad –, anemia, baixo nível de
vitamina A, febre, tosse e diarreia – com a PNDS – as regressões são estimadas
usando-se um modelo probit. Para a saúde reportada as regressões são estimadas
usando-se um probit ordenado.
4.2 RESULTADOS
A tabela 2 apresenta os resultados das regressões incluindo apenas características das
crianças como variáveis de controle. Para as regressões estimadas usando-se um modelo
probit são apresentados os efeitos marginais; e para as regressões estimadas pelo método
de MQO ou usando-se um probit ordenado são mostrados os coeficientes.
TABELA 2
Renda domiciliar per capita e saúde das crianças
POF Pnad
z-score
do peso
z-score
da altura
Saúde
reportada
Doente
de cama
Restrições nas
atividades diárias
Vômito ou
Diarreia
Ln (renda domiciliar 0,376 0,438 –0,178 –0,003 –0,001 –0,002
per capita) [0,038]*** [0,046]*** [0,006]*** [0,001]*** [0,001] [0,001]***
Observações 10.923 10.923 58.322 58.327 58.327 32.102
PNDS
z-score
do peso
z-score
da altura
Anemia Vitamina A
baixa
Febre Tosse Diarreia
(3 meses)
Diarreia
(2 semanas)
Ln (renda domiciliar 0,189 0,136 -0,025 -0,013 -0,002 -0,011 -0,028 -0,028
per capita) [0,027]*** [0,032]*** [0,010]*** [0,012] [0,008] [0,010] [0,012]** [0,005]***
Observações 5.161 5.083 5.049 5.126 6.236 6.233 6242 6239
Fonte: POF de 2002/2003, Pnad de 2003 e PNDS de 2006. Elaboração do autor.
Notas: Os erros-padrão robustos são mostrados entre colchetes.Os controles incluem: idade, sexo, dummies para região e uma dummy para área
urbana em todas as regressões. Para a POF e a PNAD, também são incluídas dummies para raça.
Para os z-scores do peso e da altura as regressões são estimadas por MQO. Para a saúde reportada é usado um probit ordenado. Os resultados
reportados nesses casos se referem aos coeficientes. Para as demais variáveis é usado um modelo logit e são reportados os efeitos marginais.
* indica que o coeficiente é significativo para o nível de 10%, ** indica que o coeficiente é significativo para o nível de 5%, e *** indica que o
coeficiente é significativo para o nível de 1%
ipea texto para discussão | 1397 | fev. 2009 15
A maior parte dos resultados indica que crianças mais ricas têm melhores
condições de saúde. Tanto para os dados da POF quanto da PNDS, as regressões
mostram que a renda tem impacto positivo e significativo sobre a altura e o peso das
crianças. Com os dados da Pnad, apenas para a incidência de dias de atividade restrita
os resultados não são significativos. Nas demais colunas, níveis mais altos de renda
estão associados à melhor saúde reportada e a menor incidência de dias doente de
cama e de vômito ou diarreia. Com a PNDS, além das medidas antropométricas,
efeitos significativos da renda também são encontrados para as probabilidades de
anemia e de episódios de diarreia nos períodos de três meses e de duas semanas.
Na tabela 3, são apresentadas regressões que acrescentam aos controles
características do domicílio e dos pais. Nesse caso, todos os resultados com a POF e a
Pnad indicam que crianças em domicílios com renda mais elevada possuem melhores
condições de saúde. De acordo com os dados da PNDS, incrementos na renda estão
associados a aumentos no z-score do peso e da altura, assim como a reduções na
incidência de anemia e de diarreia entre as crianças. Ainda de acordo com a tabela 3,
níveis mais elevados de educação dos pais estão associados a melhores condições de
saúde das crianças em parte das regressões. Alguns resultados também indicam que
pais com mais idade tendem a ter filhos mais saudáveis.
Em comparação com os resultados apresentados na tabela 2, os coeficientes
estimados para a renda domiciliar nas regressões com características dos pais e do
domicílio como controles são menores em valor absoluto, já que algumas dessas
variáveis, além de influenciarem a saúde das crianças, são correlacionadas com a renda.
Ainda assim, na maior parte das equações os coeficientes para a renda domiciliar são
significativos, indicando que crianças em domicílios mais pobres apresentam, em
média, piores condições de saúde do que crianças em domicílios mais ricos.
Crianças em domicílios mais pobres podem já ter nascido com saúde pior do que
crianças mais ricas. Parte da relação estimada entre renda e saúde pode estar refletindo
esse fato. A PNDS oferece informações sobre o peso das crianças ao nascer, conforme
a marcação no cartão de nascimento. As regressões da tabela 4 incluem uma dummy
igual a 1 para crianças que nasceram com menos de 2,5 kg, que é considerado um
peso abaixo do normal.11 Também são mostradas regressões incluindo uma interação
entre essa dummy e o log da renda domiciliar per capita. Alguns resultados indicam
que crianças que nasceram com pouco peso apresentam piores condições de saúde. As
regressões na parte inferior da tabela 4 mostram também que esse efeito do baixo peso
sobre a saúde é mais acentuado para as crianças mais pobres. Os coeficientes da renda
diminuem um pouco com a inclusão dessas novas variáveis; esses coeficientes deixam
de ser significativos para o z-score da altura e a probabilidade de anemia quando as
regressões são estimadas usando-se a variável para crianças com baixo peso no
nascimento e a sua interação com a renda.
A saúde das crianças deve ser influenciada também por diversos outros fatores –
possivelmente correlacionados com a renda domiciliar – não incluídos na análise até
agora. Os resultados apresentados a seguir procuram considerar os efeitos de alguns
11. Ver Case e Paxson (2002) e Currie e Moretti (2007), por exemplo.
16 texto para discussão | 1397 | fev. 2009 ipea
desses outros fatores e suas implicações para a relação entre renda domicíliar e saúde
infantil.
TABELA 3
Renda domiciliar per capita e saúde das crianças
POF Pnad
z-score
do peso
z-score
da altura
Saúde
reportada
Doente
de cama
Restrições nas
atividades diárias
Vômito ou
Diarreia
Ln (renda domiciliar 0,235 0,274 –0,129 –0,006 –0,006 –0,002
per capita) [0,048]*** [0,057]*** [0,007]*** [0,001]*** [0,002]*** [0,001]**
Educação do pai 0,00 0,009 –0,01 0,00 0,00 0,00
[0,012] [0,015] [0,002]*** [0,000] [0,000] [0,000]
Educação da mãe 0,026 0,026 –0,018 0,00 0,00 0,00
[0,011]** [0,015]* [0,002]*** [0,000] [0,000] [0,000]
Idade do pai 0,011 0,008 –0,002 0,00 0,00 0,00
[0,004]** [0,005]* [0,001]*** [0,000]** [0,000] [0,000]
Idade da mãe 0,005 0,00 –0,003 0,00 0,00 0,00
[0,004] [0,006] [0,001]*** [0,000] [0,000] [0,000]
Observações 10.923 10.923 58.322 58.327 58.327 32.102
PNDS
z-score
do peso
z-score
da altura
Anemia
Vitamina A
baixa
Febre Tosse
Diarreia
(3 meses)
Diarreia
(2 semanas)
Ln (renda domiciliar 0,116 0,064 –0,021 –0,007 0,014 0,002 –0,021 –0,023
per capita) [0,030]*** [0,030]** [0,012]* [0,014] [0,009] [0,012] [0,012]* [0,006]***
Educação da pai 0,006 0,01 –0,001 0,009 –0,007 –0,008 –0,002 –0,004
[0,009] [0,009] [0,003] [0,004]** [0,003]** [0,004]** [0,003] [0,002]**
Educação da mãe 0,028 0,034 0,00 –0,011 0,001 0,005 –0,002 0,006
[0,010]*** [0,009]*** [0,003] [0,004]*** [0,003] [0,004] [0,004] [0,002]***
Idade do pai 0,006 0,008 0,00 0,002 –0,001 0,001 0,003 0,002
[0,003]* [0,004]** [0,001] [0,001] [0,001] [0,001] [0,002]* [0,001]**
Idade da mãe 0,004 0,008 –0,002 0,001 –0,002 –0,008 –0,006 –0,005
[0,005] [0,005]* [0,002] [0,002] [0,002] [0,002]*** [0,002]** [0,001]***
Observações 4.783 4.714 4.722 4.774 56806 5.804 5.812 5.809
Fonte: POF de 2002/2003, Pnad de 2003 e PNDS de 2006. Elaboração do autor.
Notas: Os erros-padrão robustos são mostrados entre colchetes.Os controles em todas as regressões incluem: idade, sexo, dummies para região,
uma dummy para área urbana, número de crianças no domicílio com idade entre 0 e 4 anos,entre 5 e 9 anos e entre 10 e 14 anos, e número total
de pessoas no domicílio. Para a POF e a Pnad, também são incluídas dummies para raça.
Para os z-scores do peso e da altura as regressões são estimadas por MQO. Para a saúde reportada é usado um probit ordenado. Os resultados
reportados nesses casos se referem aos coeficientes. Para as demais variáveis é usado um modelo logit e são reportados os efeitos marginais.
* indica que o coeficiente é significativo para o nível de 10%, ** indica que o coeficiente é significativo para o nível de 5%, e *** indica que o
coeficiente é significativo para o nível de 1%.
ipea texto para discussão | 1397 | fev. 2009 17
TABELA 4
Renda domiciliar per capita e saúde das crianças
(Incluindo o peso da criança ao nascer)
PNDS
z-score
do peso
z-score
da altura
Anemia Vitamina A
baixa
Febre Tosse Diarreia
(3 meses)
Diarreia
(2 semanas)
Ln (renda domiciliar 0,102 0,055 –0,022 –0,008 0,014 0,001 –0,022 –0,024
per capita) [0,030]*** [0,030]* [0,012]* [0,014] [0,009] [0,012] [0,012]* [0,006]***
Peso ao nascer baixo –0,636 –0,393 –0,024 –0,032 0,023 –0,056 –0,034 –0,024
[0,095]*** [0,121]*** [0,049] [0,052] [0,031] [0,040] [0,034] [0,018]
Observações 4.783 4.714 4.722 4.774 5.806 5.804 5.812 5.809
PNDS
z-score
do peso
z-score
da altura
Anemia Vitamina A
baixa
Febre Tosse Diarreia
(3 meses)
Diarreia
(2 semanas)
Ln (renda domiciliar 0,096 0,045 –0,014 –0,008 0,012 –0,001 –0,022 –0,021
per capita) [0,031]*** [0,031] [0,012] [0,014] [0,010] [0,012] [0,012]* [0,006]***
Peso ao nascer baixo –0,993 –1,011 0,512 –0,08 –0,076 –0,218 –0,021 0,123
[0,392]** [0,456]** [0,164]*** [0,209] [0,127] [0,162] [0,112] [0,072]*
Ln (renda dom.
per capita) x peso 0,076 0,131 –0,121 0,01 0,021 0,034 –0,003 –0,034
ao nascer baixo [0,084] [0,099] [0,032]*** [0,044] [0,027] [0,034] [0,023] [0,017]**
Observações 4.783 4.714 4.722 4.774 5.806 5.804 5.812 5.809
Fonte: POF de 2002/2003, Pnad de 2003 e PNDS de 2006. Elaboração do autor.
Notas: Os erros-padrão robustos são mostrados entre colchetes.Os controles em todas as regressões incluem: idade, sexo, dummies para região,
uma dummy para área urbana, número de crianças no domicílio com idade entre 0 e 4 anos,entre 5 e 9 anos e entre 10 e 14 anos, e número total
de pessoas no domicílio, além da idade e da educação dos pais e das mães. Para a POF e a Pnad, também são incluídas dummies para raça.
Para os z-scores do peso e da altura as regressões são estimadas por MQO. Para a saúde reportada é usado um probit ordenado. Os resultados
reportados nesses casos se referem aos coeficientes. Para as demais variáveis é usado um modelo logit e são reportados os efeitos marginais.
* indica que o coeficiente é significativo para o nível de 10%, ** indica que o coeficiente é significativo para o nível de 5%, e *** indica que o
coeficiente é significativo para o nível de 1%.
O comportamento dos pais também deve ser um determinante importante da
saúde das crianças. Evidências mostram que crianças cujas mães são fumantes
apresentam normalmente piores condições de saúde (CASE; PAXSON, 2002). Devese
notar, porém, que o fato de a mãe ser fumante deve estar associado a uma renda
domiciliar mais baixa, assim como pode estar correlacionado com outras variáveis que
dizem respeito ao comportamento do indivíduo. A partir dos dados da PNDS, é
possível saber se a mãe é fumante ou não. A tabela 5 mostra os resultados de
regressões que incluem, além das variáveis que fazem parte da tabela 3, uma dummy
igual a 1 quando a mãe é fumante e igual a 0, caso contrário.
Pode-se notar pela tabela 5 que o fato de a mãe ser fumante está associado a
piores condições de saúde das crianças para quatro das oito medidas utilizadas. Os
resultados referentes ao efeito da renda domiciliar per capita deixam de ser
significativos para as probabilidades de anemia e de diarreia no período de três meses
antes da pesquisa. Para os z-scores do peso e da altura e a probabilidade de diarreia no
período de duas semanas, os coeficientes permanecem significativos como na tabela 3.
18 texto para discussão | 1397 | fev. 2009 ipea
TABELA 5
Renda domiciliar per capita e saúde das crianças
(Incluindo uma dummy para mãe que é fumante)
PNDS
z-score
do peso
z-score
da altura
Anemia Vitamina A
baixa
Febre Tosse Diarreia
(3 meses)
Diarreia
(2 semanas)
Ln (renda domiciliar 0,118 0,062 –0,019 –0,005 0,015 0,003 –0,018 –0,022
per capita) [0,031]*** [0,031]** [0,012] [0,014] [0,009] [0,012] [0,012] [0,006]***
Mãe fumante 0,087 -0,078 0,048 0,067 0,034 0,034 0,122 0,039
[0,083] [0,083] [0,026]* [0,034]* [0,025] [0,032] [0,033]*** [0,017]**
Observações 4.783 4.714 4.722 4.774 5.806 5.804 5.812 5.809
Fonte: POF de 2002/2003, Pnad de 2003 e PNDS de 2006. Elaboração do autor.
Notas: os erros-padrão robustos são mostrados entre colchetes.Os controles em todas as regressões incluem: idade, sexo, dummies para região,
uma dummy para área urbana, número de crianças no domicílio com idade entre 0 e 4 anos,entre 5 e 9 anos e entre 10 e 14 anos, e número total
de pessoas no domicílio, além da idade e da educação dos pais e das mães. Para a POF e a Pnad, também são incluídas dummies para raça.
Para os z-scores do peso e da altura as regressões são estimadas por MQO. Para a saúde reportada é usado um probit ordenado. Os resultados
reportados nesses casos se referem aos coeficientes. Para as demais variáveis é usado um modelo logit e são reportados os efeitos marginais.
* indica que o coeficiente é significativo para o nível de 10%, ** indica que o coeficiente é significativo para o nível de 5%, e *** indica que o
coeficiente é significativo para o nível de 1%.
Como apontam Case, Lubotsky e Paxson, (2002), pais em piores condições de
saúde podem apresentar maior probabilidade de terem filhos com pior saúde, seja
pela maior propensão a certas doenças ou pelo fato de pais doentes não poderem
oferecer atenção adequada aos filhos.12 A tabela 6 apresenta regressões, com os dados
da Pnad, que incluem uma variável indicando que pais ou mães têm saúde reportada
muito boa ou boa. Já com os dados da POF, a saúde dos pais e das mães é
representada pelo Índice de Massa Corporal (IMC), e no caso da PNDS apenas pelo
IMC da mãe, pois essa variável não está disponível para os pais.
De acordo com os resultados da POF e da Pnad, a saúde das crianças é melhor,
em média, quando os pais têm IMC mais alto ou saúde reportada muito boa ou
boa.13 Para a PNDS, os resultados estimados para algumas medidas também mostram
uma associação positiva entre o IMC das mães e a saúde dos filhos. Com relação aos
efeitos da renda domiciliar sobre a saúde das crianças, os resultados mudam muito
pouco em relação aos reportados na tabela 3.
12. No entanto, esses mesmos autores também ressaltam que a saúde pode captar efeitos associados à renda no
passado ou a erros de medida na renda em regressões usando medidas de saúde como variável dependente.
13. Case, Lubotsky e Paxson (2002) utilizam o IMC como medida de comportamento dos pais, e mostram que pais
obesos, com valor elevado para o IMC, têm filhos com pior saúde nos Estados Unidos.
ipea texto para discussão | 1397 | fev. 2009 19
TABELA 6
Renda domiciliar per capita e saúde das crianças
(Incluindo as condições de saúde dos pais)
POF Pnad
z-score
do peso
z-score
da altura
Saúde
reportada
Doente
de cama
Restri. nas
ativ. Diárias
Vômito ou
Diarreia
Ln (renda domiciliar 0,226 0,27 –0,1 –0,004 –0,004 –0,002
per capita) [0,049]*** [0,059]*** [0,007]*** [0,001]*** [0,002]** [0,001]**
IMC do pai 0,027 0,026
[0,005]*** [0,008]***
IMC da mãe 0,044 0,029
[0,007]*** [0,012]**8
Saúde do pai muito –0,383 –0,012 –0,019 –0,003
boa ou boa [0,015]*** [0,002]*** [0,003]*** [0,002]
Saúde da mãe –0,52 –0,021 –0,034 –0,006
muito boa ou boa [0,014]*** [0,002]*** [0,003]*** [0,002]***
Observações 10.923 10.923 58.322 58.327 58.327 25.855
PNDS
z-score
do peso
z-score
da altura
Anemia Vitamina A
baixa
Febre Tosse Diarreia
(3 meses)
Diarreia
(2 semanas)
Ln (renda domiciliar 0,112 0,061 –0,021 –0,008 0,014 0,002 –0,021 –0,023
per capita) [0,030]*** [0,030]** [0,012]* [0,014] [0,009] [0,012] [0,012]* [0,006]***
IMC da mãe 0,038 0,014 0,002 0,003 –0,007 0,001 –0,001 0,001
[0,005]*** [0,004]*** [0,002] [0,002] [0,002]*** [0,002] [0,002] [0,001]
Observações 4.783 4.714 4.722 4.774 5.806 5.804 5.812 5.809
Fonte: POF de 2002/2003, Pnad de 2003 e PNDS de 2006. Elaboração do autor.
Notas: Os erros-padrão robustos são mostrados entre colchetes.Os controles em todas as regressões incluem: idade, sexo, dummies para região,
uma dummy para área urbana, número de crianças no domicílio com idade entre 0 e 4 anos,entre 5 e 9 anos e entre 10 e 14 anos, e número total
de pessoas no domicílio, além da idade e da educação dos pais e das mães. Para a POF e a Pnad, também são incluídas dummies para raça.
Para os z-scores do peso e da altura as regressões são estimadas por MQO. Para a saúde reportada é usado um probit ordenado. Os resultados
reportados nesses casos se referem aos coeficientes. Para as demais variáveis é usado um modelo logit e são reportados os efeitos marginais.
* indica que o coeficiente é significativo para o nível de 10%, ** indica que o coeficiente é significativo para o nível de 5%, e *** indica que o
coeficiente é significativo para o nível de 1%.
5 CONCLUSÃO
Diversos estudos na literatura têm mostrado que a renda parece um importante
determinante da saúde infantil, mesmo em países com oferta gratuita de serviços de
saúde para a população. Procuramos investigar neste artigo como a renda domiciliar per
capita está relacionada às condições de saúde das crianças no Brasil. Essa análise é feita
com base nos dados de três diferentes pesquisas de abrangência nacional, a POF, a
Pnad e a PNDS, e levando-se em conta uma série de fatores que podem influenciar
simultaneamente a saúde das crianças e a renda domiciliar, como a educação dos pais, o
peso da criança ao nascer, que pode ser usado como indicador da sua condição de saúde
inicial, e variáveis para captar o comportamento e as condições de saúde dos pais.
De acordo com os resultados estimados, crianças em domicílios mais pobres
têm, em média, condições de saúde piores do que crianças mais ricas. Crianças mais
pobres tendem a apresentar menor altura, menor peso, saúde reportada pior, assim
como maior incidência de dias doente de cama, de restrições nas atividades diárias e
20 texto para discussão | 1397 | fev. 2009 ipea
de vômito ou diarreia. Além disso, também existe evidência de que crianças mais
pobres têm probabilidade maior de apresentarem anemia.
De acordo com os resultados, portanto, as disparidades de renda no Brasil se
refletem em diferenças entre as condições de saúde de crianças pobres e ricas, mesmo
quando outras características são levadas em consideração, como o comportamento
dos pais e seus níveis de educação e saúde. Também mostramos evidências de que
baixo peso ao nascer tende a afetar a saúde infantil, mas somente entre aqueles que
vivem com níveis mais baixos de renda. Adicionalmente, é importante destacar que
mesmo com a oferta de serviços de saúde pelo Sistema Único de Saúde (SUS), a
renda domiciliar se mostra um determinante importante da saúde infantil.
Os resultados apresentados neste artigo podem ter implicações importantes no
longo prazo, pois a pobreza durante a infância pode influenciar o futuro das crianças
e possivelmente até suas gerações futuras. Crianças menos saudáveis tendem a
apresentar pior desempenho escolar e, dessa forma, a se tornarem futuramente
trabalhadores menos qualificados. A desvantagem no mercado de trabalho para essas
crianças pode ser ampliada ainda mais, já que piores condições de saúde na infância
podem persistir ou até se intensificar na vida adulta. Adultos com pior saúde também
tendem a ser menos produtivos e, portanto, menos capazes de auferir renda no
mercado de trabalho. Sendo assim, a precariedade de saúde por insuficiência de renda
na infância pode ser um importante transmissor intergeracional de desigualdade de
renda e contribuir para a persistência da pobreza.
REFERÊNCIAS
BARROS, R. P. de. Infância e pobreza no Brasil. 2008. Mimeografado.
BARROS, R. P. de; CARVALHO, M.; FRANCO, S.; MENDONÇA, R. A importância da
queda recente da desigualdade para a pobreza. In: BARROS, R. P. de; FOGUEL , M.;
ULYSSEA, G. (Orgs.). Desigualdade de renda no Brasil: uma análise da queda recente. Rio de
Janeiro: Ipea, 2007a.
BARROS, R. P. de; CURY, S.; ULYSSEA, G. A desigualdade de renda no Brasil encontra-se
subestimada? Uma análise comparativa usando Pnad, POF e Contas Nacionais. In:
BARROS, R. P. de; FOGUEL, M.; ULYSSEA, G. (Orgs.). Desigualdade de renda no Brasil:
uma análise da queda recente. Rio de Janeiro: Ipea, 2007b.
CASE, A.; DEATON, A. Health and wealth among the poor: India and South Africa
compared. American Economic Review Papers and Proceedings, v. 95, n. 2, 2005.
CASE, A.; FERTIG, A.; PAXSON, C. The lasting impact of childhood health and
circumstance. Journal of Health Economics, v. 24, 2005.
CASE, A.; LEE, D.; PAXSON, C. The income gradient in children’s health: a comment on
currie, shields and price. 2007 (NBER Working Paper, n. 13.495).
CASE, A.; LUBOTSKY, D.; PAXSON, C. Economic status and health in childhood: the
origins of the gradient. American Economic Review, v. 92, n. 5, 2002.
CASE, A.; PAXSON, C. Parental behavior and child health. Health Affairs, v. 2, n. 2, 2002.
_____________. Stature and status: height, ability, and labor market outcomes. Journal of
Political Economy, v. 116, n. 3, 2006.
CRESPO, A.; REIS, M. Child health, household income and the local public provision of health
care in Brazil. 2008. Mimeografado.
ipea texto para discussão | 1397 | fev. 2009 21
CURRIE, J. Healthy, wealthy, and wise: socioeconomic status, poor health in childhood, and
human capital development. 2008 (NBER Working Paper, n. 13.987).
CURRIE, J.; MORETTI, E. Biology as destiny? Short and long-run determinants of
intergenerational transmission of birth weight. Journal of Labor Economics, v. 25, n. 2, 2007.
CURRIE, A.; SHIELDS, M.; PRICE, S. The child health/family income gradient: evidence
from England. Journal of Health Economics, v. 26, n. 1, 2007.
CURRIE, J.; STABILE, M. Socioeconomic status and health: why is the relationship
stronger for older children? American Economic Review, v. 93, n. 5, 2003.
DUFLO, E. Grandmothers and granddaughters: old age pension and intra-household allocation
in South Africa. 2000 (NBER Working Paper, n. 8.061).
FOGEL, R. Economic growth, population theory and physiology: the bearing of long-term
processes on the making of economic policy. American Economic Review, v. 84, p. 369-395,
1994.
___________. New findings on the secular trends in nutrition and mortality: some
implications for population theory. In: ROSENZWEIG, M.; STARK, O. (Eds.). Handbook
of Population and Family Economics. Amsterdam: Elsevier, 1997. v. 1A.
HOFFMAN, R. Pobreza e desnutrição das crianças no Brasil: diferenças regionais e entre
áreas urbanas e rurais. Economia Aplicada, v. 2, n. 2, 1998.
IDLER, E.; BENYAMINI, Y. Self-rated health and mortality: a review of twenty-seven
community studies. Journal of Health and Social Behavior, v. 38, n. 1, 1997.
MACHADO, D. Efeitos da saúde na idade de entrada à escola. Pesquisa e Planejamento
Econômico, v. 38, n. 1. 2008.
PRESTON, S. The changing relation between mortality and the level of economic
development. Population Studies, v. 29, p. 231-248, 1975.
PRITCHETT , L.; SUMMERS, L. Wealthier is healthier. Journal of Human Resources, v. 31,
p. 841-868, 1996.
RAMALHO, R.; FLORES, H.; SAUNDERS, C. Hipovitaminose A no Brasil: um problema
de saúde pública. Revista Saúde Pública, v. 12, n. 2, 2002.
SMITH, J. Healthy bodies and thick wallets: the dual relation between health and economic
status. Journal of Economic Perspectives, v. 13, n. 2, 1999.
WARE, J.; DAVIES-AVERY, A.; DONALD, C. General health perceptions. R-1987/5 HEW,
RAND. Santa Monica, California, 1978.
WHO, Working Group. Use and interpretation of anthropometric indicators of nutritional
status. Bulletin of the World Health Organization, v. 64, n. 6, p. 929-941, 1986.
WHO. Iron deficiency anemia: assessment, prevention and control – a guide for program
managers. 2001.
22 texto para discussão | 1397 | fev. 2009 ipea
© Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada -- Ipea 2009
EDITORIAL
Coordenação
Iranilde Rego
Supervisão
Andrea Bossle de Abreu
Revisão e Editoração
Equipe Editorial
Livraria
SBS -- Quadra 1 -- Bloco J -- Ed. BNDES,
Térreo
70076-900 -- Brasília -- DF
Fone: (61) 3315-5336
Correio eletrônico: livraria@ipea.gov.br
Tiragem: 130 exemplares